Viajando sem sair de casa

4 de agosto de 2009


Maggie Marsek - Sea Layer

O advento das novas tecnologias de previsão de ondas e a profissionalização definitiva do turismo ligado ao surf promoveram transformações significativas na maneira com que um surfista se prepara para uma surf trip.

Viajar em busca de ondas perfeitas e vazias sempre foi e será o pote de ouro no fim do arco-íris para todo surfista que decide por o pé na estrada e encarar os maiores desafios atrás desse sonho. Este sentimento que une os apaixonados pelas ondas nos quatro cantos do mundo é responsável por definir o espírito nômade e aventureiro inerente à experiência de ser surfista.

Ao sentimento de aventura de dar uma chance ao desconhecido em busca de uma praia nunca antes surfada se agrega o contato com novas paisagens, povos e culturas, que juntos formam um mosaico de experiências que ficam guardadas para sempre em nossa memória e uma saudável fonte de amigos e contatos pelo mundo afora.



A verdade é que a lista de surf trips de um surfista é quase como um currículo de graduação em surf, onde quanto mais milhagem acumulada em viagens, maior será a admiração e o respeito de seus colegas. De um fim de semana de carro com um grupo de amigos até um pico há menos de 200 quilometros de casa, até uma viagem de sonho para um atol deserto nas ilhas Maldivas - com direito a longos translados de avião, moto e barco para chegar até as ondas – a premissa é sempre a mesma: viver novas emoções e experiências.

Em meio à ampla gama de opções e estilos de viagem algumas publicações se destacam por oferecer informações e imagens valiosas que mantém acessa a paixão pelas viagens de surf e funcionam como excelentes fontes de consulta, mesmo que sejam utilizadas apenas para inspirar o simples desejo de cair na estrada.



O melhor e mais bem editado trabalho neste sentido talvez seja o Stormrider Guide dos ingleses da Low Pressure, que desde 1991 editam guias muito informativos, frutos de um extenso trabalho de catalogar as ondas que quebram nos quatro cantos do planeta, ilustrados em belos livros com fotos inspiradoras.

É possível adquirir a coleção completa ou comprar apenas volumes separados em regiões – Europa, África, Oceano Índico, Leste da Ásia, Austrália, Oceano Pacífico, América do Norte, América Central e Amérca do Sul - e, apesar de algumas falhas devido a dificuldade em manter atualizadas informações sobre determinados aspectos sócio-econômicos de algumas regiões, o investimento certamente vale a pena, nem que seja apenas para folhear o guia em casa em um dia frio e sem ondas.

Sem nenhum desses recursos gráficos, mas tão abrangente quanto, o The Surf Report da revista Surfer Magazine é também um guia completo em termos de ondas para o surf. Publicado ao longo dos anos como um encarte de duas cores dentro das edições da revista, as fichas das mais diversas regiões do planeta podem ser adquiridas em um imenso fichário que reúne todas as edições - e também em edições eletrônicas especiais.

Tenho carinho especial pelo Surf Report, pois ele me remete a uma trip pelas Ilhas Canárias, onde as cópias de fax rasuradas que me haviam sido enviadas foram a minha única fonte confiável de informação sobre os muitos picos de surf da região, numa era pré-internet.



Hoje, procurar uma das muitas agências de viagem especializadas em pacotes para surfistas, como a Nivana, é um caminho óbvio para ter segurança de que o tempo e dinheiro investidos vão valer a pena, além de eliminar ao máximo as questões burocráticas e de planejamento.

Para muitos, no entanto, a parte de pesquisa e planejamento chega a ser tão excitante quanto a própria viagem em si, já que a emoção dos preparativos são vividas como parte da aventura, numa antecipação que será ainda mais saboreada uma vez que os objetivos forem alcançados.

Neste sentido, os sites especializados como em previsão das ondas como Waves, Surfline, Windguru, Surfguru, Magic Seaweed e tantos outros, são uma verdadeira mão na roda e permitem ao surfista se aclimatar virtualmente aos picos que irá surfar num futuro próximo. Lembro de um amigo que passou a acessar diariamente as condições de surf na Gold Coast da Austrália nas semanas que antecederam a sua viagem para lá - as surfcams em tempo real permitem praticamente surfar a onda com os olhos enquanto ela quebra na tela do computador e até mesmo no celular.

Exageros a parte, hoje ninguém deixa de checar a previsão de ondas para os picos de destino para preparar o quiver e o equipamento de maneira que o surfista já tem uma boa idéia do que vai encontrar quando chegar no local. Guias eletrônicos como a chamada Travel Bible da revista australiana Surfing Life trazem uma extensa (e pretensa) lista dos melhores picos de surf do mundo com informações sobre cada um – do Brasil, temos na lista apenas a praia de Itaúna em Saquarema, o que dá a dimensão do grau de exigência dos aussies.

Por aqui, vale citar guias como o Surf Guia Brasil - conheço o exemplar sobre Santa Catarina editado pelo Máurio Borges - que se concentra apenas na descrição das ondas e não traz informações turísticas como um Guia Quatro Rodas por exemplo.

E se a expectativa e surpresa de uma viagem foram em grande escala arrefecidas pela possibilidade de antecipar as condições do mar e pesquisar toda sorte de informações turísticas - como acomodação e alimentação - podemos dizer que as surf-trips perderam o seu principal diferencial e se enquadram no mesmo esquema das pessoas que programam uma semana de diversão em um resort de golfe, por exemplo?

A resposta a esta questão é bastante subjetiva, afinal, quem poderá culpar um empresário bem-sucedido que conseguiu com esforço arranjar tempo e dinheiro suficientes para se hospedar durante a sua semana de férias em um resort tropical de luxo na Costa Rica, em quartos climatizados com restaurante gourmet, de frente para os melhores picos da região e ainda ciceroneados pelos locais, que entendem a importância econômica do turismo e liberam as melhores ondas para os hóspedes vips?



No outro lado da moeda, alguns encaram a surf trip como uma verdadeira busca espiritual, onde a essência de uma viagem é justamente desligar-se das amarras da civilização moderna e largar-se ao sabor do vento em busca do autoconhecimento. Um belo retrato deste sentimento é o recém-lançado filme The Drifter, que documenta as andanças de um solitário Rob Machado pelos confins da Indonesia. Assim como este, tantos outros filmes de surf nada mais são do que uma coleção de registros de viagens.

Ferramentas como o Google Earth permitem a qualquer um mapear novos picos com potenciais de surf, imaginando as ondas selvagens em lugares inóspitos como o litoral do Sudão e da gelada Groelândia, por exemplo. E assim, percebemos que ainda existe um vasto universo a ser explorado e que, independente dos mecanismos utilizados, haverá sempre algo de novo a experimentar e descobrir em uma surf trip.

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