Valor Impresso

30 de abril de 2013




Tinha 9 anos de idade quando meu pai me levou na banca de jornal para comprar a minha primeira revista de surf. Era a edição 18 da revista Fluir que trazia na capa uma foto icônica do fotógrafo Bruno Alves, com o surfista Almir Salazar entubando numa Joaquina quebrando de gala durante o Hang Losse Pro de 1986. Lembro que era um especial de aniversário com mais páginas que a edição comum, cheia de fotos do campeonato e recheada também de publicidade, no auge da explosão comercial da surfwear nos anos 80 no Brasil.




Sempre fui fanático por revistas em geral e, sendo o surf uma paixão, as semente do jornalismo e do desejo de escrever sobre surf foram plantadas em mim desde aquela época em que devorava edições da Fluir e Visual Esportivo, passando posteriormente para a Hardcore e a saudosa edição brasileira da Surfer.

Numa era pré-internet, folhear as revistas com tanta informação visual e escrita sobre o surf proporcionava uma satisfação comparável ao próprio ato de surfar e era a fonte primordial para consolidar todo o nosso imaginário sobre o mundo das ondas. Na mão de adolescentes em busca de afirmação e referências como eu, estas revistas tinham suas páginas mais interessantes arrancadas e coladas nas paredes do quarto, cadernos e qualquer outro lugar onde pudessem ficar em evidência. Por conta disso, meu acervo até meados dos anos 90 ficou bem detonado.




Muita coisa mudou de lá pra cá no surf e na mídia e eu demorei muitos anos para conseguir conciliar as duas atividades de forma produtiva em minha vida. Ironicamente, somente com a chegada da revolução digital é que as portas das cada vez mais enxutas redações de revistas impressas de surf se abriram para minhas colaborações, por meio da divulgação de trabalho autoral na internet que encontrei com a criação do Surf & Cult.

E se hoje vivemos em uma realidade editorial onde cada vez mais a imagem vale mais do que as palavras, a profissão de jornalista é listada frequentemente como a pior de todas as possilidades profissionais, e as revistas impressas competem por espaço e atenção com um fluxo ininterrupto de conteúdo publicado nas mais diferentes plataformas, qual o significado de ver um texto de minha autoria publicado na edição 330 da revista Fluir?

 

Bom, o significado imediato está na sensação de ver um ciclo se completar após 25 anos, desde a doce lembrança de quando comprei a minha primeira edição da revista, passando pelos tantos momentos em que imaginei que o meu nome um dia poderia estar ali, até este mês, quando ele de fato apareceu ali pela primeira vez.

A verdade é que, apesar dos pesares, o texto impresso no papel ainda possui uma força de permanência talvez difícil de explicar para quem já nasceu no mundo das telas digitais. Nostalgia ou não, o apreço em ver os meus textos impressos num conteúdo editorial de uma publicação de alta qualidade é algo que se transforma numa experiência agradável - palpável e "armazenável" - cada vez que acontece.



Foi assim com as contribuições para a Hardcore e em todas as edições que tenho participado na The Surfer`s Journal Brasil, as quais guardo com zelo em minha estante. No caso da última edição de abril da Fluir, a oportunidade se materializou na resenha sobre "The Heart & The Sea", o inspirador longa-metragem do australiano Nathan Oldfield - filme que também tive o prazer de legendar para o português.

Por fim, mais do que apenas um prazer pessoal, tenho também um significado que de vez em quando torna nobre o ofício do jornalista: daqui a 25 anos, se alguém, por algum motivo qualquer, decidir pesquisar sobre este filme, lá vai estar o meu registro da época arquivado na matéria "Coração no Mar" na edição 330 da revista Fluir.

Bela Vida

23 de abril de 2013

É impossível começar a falar sobre Jason Baffa, sem lembrar que ele é o criador de duas obras seminais do gênero "filmes de surf": "Singlefin Yellow" e "One California Day", dois documentários que reúnem boas ideias, bons personagens, fotografia caprichada e insights poéticos, formando narrativas inspiradoras.



Agora, o produtor e diretor norte-americano está prestes a finalizar a sua trilogia audiovisual de surf  independente com uma obra chamada "Bella Vita", um documentário focado na cultura surf da Itália, utilizando o resgate das raizes italianas do talentoso surfista australiano Chris Del Moro como fio condutor da história.

Nos caminhos percorrido por Baffa, temos um roteiro inspirador de paisagens recheadas de cultura e história no Mar Mediterrâneo, ao qual se juntam outros nomes relevantes como Dave Rastovich, os irmãos Coffin, e uma safra de expoentes locais, como Leonardo Fioravanti e Alessandro Ponzanelli .

Rodado em película 35mm, o filme longa-metragem entra agora em fase de finalização, e Jason lançou esta semana uma campanha de financiamento coletivo no site Kickstarter, para conseguir concluir este processo crucial da obra com a qualidade desejada (e que ela merece).



Em entrevista por email, ele contou ao Surf & Cult detalhes desta produção, cujo resumo você confere a seguir:

A ideia: 

"Encontrei Chris del Moro por acaso em Bali e trocamos umas ideias sobre a fantástica e ainda pouco conhecida sub-cultura do surf na Itália. Daí ele falou desta ideia do filme, e confiou a mim esta história pessoal de sua conexão com a Itália".



As ondas na Itália:

"Tem ondas bem divertidas na Itália, mas você tem que ser extremamente paciente e persistente para se dar bem. O potencial para ondas exepcionais está lá, mas pode significar a busca de toda uma vida, pois são tantos fatores envolvidos que precisam se alinhar. Todos os surfistas locais nos apoiaram bastante. Eles queriam mostrar ao mundo o quão bom pode ser o surf italiano".



Desafios e Recompensas de filmar em 35mm:

"As câmeras são grandes e pesadas e mover-se pela praia era uma verdadeira empreitada. Mas assim que você assiste à uma tomada aquática em filme de 35mm de Dave Rastovich ou Conner Coffin executando um cutback em super câmera lenta, todas as dificuldades são rapidamente esquecidas. O visual é incrível. A pelicula simplesmente captura o movimento da água de um jeito tão bonito".



Financiamento Coletivo:

"Eu sinto que o meu público merece uma certa qualidade de produção. Não quero lançar uma porcaria de projeto. Infelizmente os projetos de filmes de surf não geram muito retorno financeiro, então eu sou deixado em um mundo onde sinto que a produção merece um certo orçamento para ser boa, mas que torna difícil conseguir esse dinheiro de volta".

"Um website como o Kickstarter permite ao público dizer: 'Sim, nós gostamos disso! Nós queremos isso!'Através do apoio do público nós conseguimos acessar estes recursos adicionais para fazer as coisas ficarem realmente boas".



Se você quiser ajudar Jason Baffa a finalizar Bella Vita, você tem até o dia 18 de maio para contribuir com o projeto clicando aqui. / crédito fotos: maffei & rugai - divulgação Bella Vita.

Horizontes Abertos

16 de abril de 2013


O primeiro domingo de outono com ares de inverno, onde o vento sul rasgante trouxe consigo uma potente e azulada ondulação de sul e dissipou todo e qualquer sinal de nuvem do céu, lá no horizonte aberto do litoral de Jaguaruna, onde a grande maioria das casas de veraneio silenciam e a natureza grita por sobre a nossa desolada insignificância...

Um cenário que abrigou o "marco zero" na produção de uma nova aventura audiovisual que se desenha no documentário A Pedra e o Farol, projeto de minha autoria pela Scult Filmes, que procura resgatar a importância do Farol de Santa Marta e da Pedra do Campo Bom - a hoje famosa Laje da Jagua - na história da região litorânea dos municípios de Laguna e Jaguaruna.



Aprovado para a captação de recursos via Lei Rouanet, o roteiro de A Pedra e o Farol percorre um caminho que passa pelo resgate dos mais de 20 naufrágios ocorridos na região, que ficou conhecida como "um cemitério de navios" e sobre o qual procuramos saber mais detalhes com o simpático sr. Egídio Farias, curador do Museu de Jaguaruna, onde ele nos recebeu para a gravação da primeira entrevista do filme.



As histórias dos muitos naufrágios catalogados em Jaguaruna ganham grande riqueza visual graças ao valioso acervo de fotos do sr. Gentil Reynaldo - fotógrafo pioneiro e por muito tempo o único na região de Jaguaruna - que documentou estes acontecimentos a partir dos anos 40. Numa época em que a cultura do veraneio ainda engatinhava e as praias eram quase desertas, os naufrágios tornaram-se verdadeiros acontecimentos, atraindo multidões que saiam em trem e carros de boi para conferir a imponência dos navios encalhados perto da costa. 



Infelizmente o sr. Gentil faleceu há poucos meses aos 91 anos, sem que pudessemos entrevistá-lo (o que estava previsto no roteiro original). E se a memória se faz não só de imagens, mas das muitas histórias que elas suscitam, algumas delas talvez tenham se perdido para sempre. Por outro lado, a participação na produção do também fotógrafo Guilherme Reynaldo, neto do sr. Gentil e um dos guardiões do histórico acervo da família, será muito importante para engrandecer visualmente a narrativa do filme.

Infelizmente também, como se percebe nos relatos do sr. Egídio sobre a situação do museu e em tantos outros contextos sociais, o interesse na valorização e na preservação da memória parece não alcançar uma parcela significativa das pessoas, que pouco se preocupam em conhecer mais a fundo a história da região onde vivem e em entender o motivo de um lugar ser como é. Conhecer o passado, para entender o presente e projetar o futuro. Talvez este seja o conceito que melhor resuma a proposta de A Pedra e o Farol.



De um isolado recanto de pescadores, as praias do Farol de Santa Marta hoje tornaram-se reduto de veranistas das mais variadas procedências e muitos surfistas atrás de suas ondas e paisagens incríveis. Do mesmo modo, a Laje da Jagua, a temida área de navegação que impulsionou a construção do Farol com sua luz protetora no Cabo de Santa Marta, hoje é território de pesca submarina e, sobretudo, reconhecida por abrigar uma das mais poderosas ondas para o big surf no Brasil nas grandes ondulações.


Recontar esta transformação contemplando todo o potencial sensorial das paisagens que compõem a região é o desafio que a proudução tem pela frente nos próximos 12 meses. O universo de depoimentos contempla historiadores, geólogos, oceanógrafos, oficiais da Marinha, pescadores e surfistas, num contexto de documentário artístico com predominância de trilha sonora insrumental e fotografia apurada, valorizando as peculiaridades das paisagens da região.


E se ainda não temos captados os recursos financeiros suficientes para engrenar uma sequencia contínua de gravações nos próximas semans, por outro lado já temos talvez a fonte propulsora principal para esta realização: o entusiasmo de pesssoas que abraçaram a ideia e impulsionaram a realização de uma primeira diária de gravação para o filme, nas figuras de David Mendonça da Mond Filmes de Tubarão, e no parceiro de vários projetos Marcos BG, que também ajudou a construir a identidade visual para este filme.



No mesmo dia, contemplando o horizonte infinito do alto das dunas, sob o sol que irradiava com intensidade por sobre a solidão de uma paisagem sem nenhuma presença humana no meu extenso raio de visão, fiquei tentando encontrar os enquadramentos que traduzissem os sentimentos que desejo transmitir com este filme. A partir do Farol em direção ao sul, o mar e a faixa de areia parecem não ter fim. E assim ficamos mais expostos aos humores da natureza diante do movimento das dunas, das ondas e do céu, que se abre a ponto de, em certos dias, podermos sentir a curvatura do planeta.





O medo de não conseguir expressar essas imagens na tela é uma ameaça latente que me impulsiona a buscar ainda mais conhecimento e ferramentas para realizar esta obra. E logo a certeza de tê-las impressas de forma profunda em minha memória sensorial, me enchem de confiança de que conseguirei transmití-las à equipe - que assim poderá contribuir com seu talento técnico e criativo para a criação coletiva inerente a um projeto audiovisual desta envergadura. Pois como se pode enxergar lá do alto da duna, o futuro é aberto.


Em breve, link para o blog do filme A Pedra e o Farol.
Empresas interessadas em apoiar o documentário A Pedra e o Farol via isenção fiscal (lei Rouanet) favor contactar: lucianoburin@gmail.com

Créditos: Surf na Laje da Jagua: Cris Arlington / Fotos de época: acervo Gentil Reynaldo / Arte de apresentação do projeto A Pedra e o Farol por Marcos BG/ outras fotos: stills e frames A Pedra e o Farol

Por quem os Sinos Rasgam

4 de abril de 2013






O campeonato em Bells Beach na Austrália é talvez o segundo evento de surf mais importante do mundo - e certamente o mais tradicional - depois do PipeMasters. A comoção via redes sociais causada pela vitória de Adriano de Souza e o desempenho acachapante de quase todo o time brasileiro na disputa deste ano repercutiu no tom da signficativa alegria gerada em quem de alguma forma acompanha o surf profissional brasileiro.

E foi tomado por essa alegria que me animei a conectar algumas linhas sobre este evento, depois de sei lá quanto tempo sem publicar alguma coisa sobre competições de surf. Porque de vez em quando uma competição de surf é sim capaz de proporcionar uma vasta gama de emoções obrigatórias numa boa sessão de entretenimento - como poucas atracões veiculadas na internet são capazes de fazer.



Tudo começou pra lá de morno nas marolas geladas de Bells e acompanhei o evento com o mesmo interesse do surfrporter Maurio Borges que postou com sua franqueza habitual: "Não tenho mais saco pra assistir aos eventos da ASP na net. Locuções chatas, tanto na Gold como agora em Bell's. Essa fórmula de competição está desgastada faz horas. Agora vejo somente os melhores momentos e olhe lá. Já se foi o tempo de querer "ficar por dentro" de tudo…". Naquela hora meus dedos instintivamente quiseram apertar o famigerado botão "Curtir" para o comentário…

Mas nada como um dia após o outro, ou melhor, dois dias após o outro. Os dois dias finais do evento em Bells foram pra lá de divertidos de assistir e me fez lembrar de premissas óbvias: Não basta ter alguns dos melhores surfistas do mundo se as ondas estão medíocres. Campeonato de surf tem que ter ondas boas e ponto final. E ter muito mais rasgadas agressivas na parede do que piruetas aéreas em junções deformadas. Isto aconteceu em Bells. Um campeonato cheio de emoções e drama.



Ao ligar o webcast, as longas séries de direita marchando me Bells capturaram o meu olhar em algum momento entre o segundo e o terceiros rounds. Das primeiras rasgadas, lembro que para o Alejo Muniz faltou uma segunda onda pra ter chances de virar a bateria. Eis que surge o ápice da emoção, o chamado "momentum" que os gringos tanto falam. Uma vibração crescente que foi se construindo ao longo da baterias.
 
Nas rasgadas de Willian Cardoso e Raoni Monteiro que atropelaram os dois primeiros colocados no ranking mundial, tive a confirmação de que esta manobra desperta no surfista que assiste o impulso de urrar o som do movimento no momento em que ele é executado. Uma descarga de adrenalina pura que ouso chamar de "a essência do surf". Infelizmente meu vocabulário literal não me permite descrever este som com alguma precisão, mas você leitor sabe do que estou falando.

Mas voltando ao aspecto mundano da disputa, o tal do Slater não estava nos seus melhores dias na bateria com Willian. O mesmo Willian que me deixou chateado meses atrás ao assistir a sua eliminação ao vivo em Sunset - uma onda onde tem tudo para se destacar, quando perdeu a bateria e a chance de classificação directa para o WCT, sufrando sem convicção numa prancha que parecia grande demais para a ocasião.

Já no caso de Raoni, que veio na sequência, o camarada Parko estava surfando no topo das suas forças, numa onda feita sob medida para quem surfa com graça e estilo, como dizem. Mas daí voltamos para os momentos em que a vontade de vencer se realiza por meio única forma de agressão sadia que existe. As surras na parede de Bells são tão empolgantes como um gol, um nocaute ou qualquer entretenimento visual que o valha. Raoni venceu por uma margem mínima de vontade e água jogada para o alto,  num duelo com médias superiores a 19 pontos.



Foi um prenúncio do que estava por vir. E aqui chegamos a Adriano de Souza, o mais obstinado de todos os obstinados surfistas brasileiros. Lembro que ouvindo a sempre temerária transmissão dos gringos, eles comentavam a vitória de Adriano no round 3 citando que ele "estava com um patrocínio novo, uma tal de "Peña" ( e não Pena) que "alguém tinha falado era um time de futebol no Brasil, ou algo assim". Sim, esta cnfusão com o apoio que ele tem do Corinthians foi um dos muitos momentos de humor involuntário durante a transmissão.

De nada adiantaria explicar pra eles que a Pena é uma marca de surf brasileira do nordeste. Que á a única empresa nacional do segmento que decidiu apostar suas fichas e bancar o patrocínio do surfista brasileiro profissional há anos mais bem ranqueado. Ok, ele poderia ser um bad boy e não gerar retorno positivo de imagem diria alguém do marketing. Mas quem conhece sua trajetória sabe que a determinação e a disciplina são seus principais atributos.

No ultimo mês de dezembro, peguei o mesmo voo com Adriano do Hawaii até Floripa. Ele voltava de uma temporada curta e pouco produtiva nas ilhas, em meio à turbulência do estremecimento de sua relação com a Oakley e, vá-la, meio que ofuscado pelo sucesso de Gabriel Medina e com a chegada da novíssima geração representada por Filipe Toledo. J;a tinha o visto cabisbaixo em Oahu e depois com um ar de cansaço extremo durante as escalas da viagem. No desembarque em Floripa não resisti e o cumprimentei com a frase "É bom voltar pra casa, não?" Ele sorriu e seus olhos e palavras expressaram o desejo de descanso para recuperar as forças e voltar a luta no ano seguinte.

Eis que pouco mais de 04 meses depois, Adriano está lá tocando ( e quebrando) o sino sagrado do surf com o seu sorriso largo característico. Na bagagem do surfista brasileiro profissional mais bem sucedido de todos os tempos, vitórias improvaváveis sobre prodígios do estilo como Kolohe Andino, o eterno ídolo local Mick Fanning e sobretudo Jordy Smith, que, na minha visão, estava surfando com uma linha e fluidez superior até que a de Parkinson. Mas, infelizmente para talentos natos como Jordy, nem só de estilo se ganha uma competição - aliás, acho que somente com estilo não se ganha quase nada de significativo nesta vida - e Adriano aplicou a sua obstinação ferina às tácticas e sobretudo à preparação física e mental para o evento.



Assim, volto aos nossos famigerados locutores da transmissão em inglês, que resolveram começar a tecer elogios a Adriano quando os australianos já eram carta fora do baralho e o brasileiro chegava como favorito na bateria final contra Nat Young. Eles falavam sobre Adriano ser um dos competidores mais dedicados, que treinou por mais tempo e com maior antecedência em Bells que os seus colegas do touro. De como ele adaptou o seu surf de curvas curtas, para os grandes arcos do surf de linha em ondas volumosas como as de Bells. De como ele era humilde no respeito à história de Bells no reconhecimento dos antigos ídolos do surf australiano e na vontade de aprender a dominar aquela onda difícil, lapidando suas manobras em muitas e muitas horas de surf no pico.

Sim, Adriano nunca será o mestre do estilo, nem o tuberider mais destemido, nem o power surfer que mais levanta água numa manobra, e nem tampouco o mestre de aéreos criativos adapatados das pistas de skate. Sim, Adriano pode ser campeão mundial com base em sua consistência, da mesma forma que Parko - talvez o seu maior antagonista em termos de surfar bem sem fazer esforço - foi no ano passado. E fará isso surfando quase tão bem quanto os seus melhores adversários em cada uma de suas especialidades. E, na maioria das vezes, em condições normais de temperatura, pressão e consistência das ondas, ele só será derrotado por quem conseguir igualar a sua determinação e vontade de vencer.

Isto tudo, somado à experiência adquirida ao longo de muitos anos entre surfando entre os melhores, o coloca no auge do seu jogo e o mais forte candidato do Brasil (ok, junto com o Medina que é capaz de tudo!) a tornar-se o primeiro brasileiro campeão do circuito mundial de surf. Bom, mas certamente você já ouviu esse papo antes.



Então termino esta reflexão tentando me lembrar de algum outro esporte onde o martelado "complexo de vira-latas" do brasileiro seja mais invocado do que no mundo do surf. Em vão. E vejo que, para o bem e para o mal, o aspecto patriótico é o que se sobressai nas redes de opiniões fomentadas tanto no Brasil quanto nas publicações estrangeiras que repercutiram os acontecimentos em Bells. Gosto de pensar que Adriano e seu patrocinador brasileiro estão pouco ligando pra isso.

No meu caso particular, o que fica depois de todas as baterias que assisti neste campeonato é a pura e simples vontade de ir pra água e sair rasgando tudo. Nessas horas posso afirmar com convicção que o surf competitivo é sim um componente importante do prazer de deslizar nas ondas.
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