24 de setembro de 2009
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Nesta semana terminei de ler o livro Fôlego de Tim Winton. Diante da escassez de títulos de ficção que tenham o surf como tema de destaque, há de se saudar a iniciativa de traduzir para o português este romance do escritor australiano, que esteve no Brasil recentemente lançando sua obra.
Para quem pega onda, as descrições e relatos sobre a iniciação do personagem principal, o garoto Bruce Pikelet, no mágico universo das ondas e das pranchas no isolado oeste australiano já bastam para fazer desta obra uma leitura prazerosa. Está ali a descoberta do sentimento que faz os surfistas se sentirem seres superiores por estabelecerem uma relação de interação completa com a natureza, representada pelos movimentos do oceano. Assim, o conteúdo do livro é repleto de descrições instigantes sobre os aspectos essenciais do surf.
Contudo, as nuances dessa relação intima com o as ondas não seria suficiente para assegurar esta obra como um best-seller de apelo universal, capaz de atingir um público muito mais abrangente. Autor renomado em seu país, Winton atinge este objetivo utilizando a relação do homem com o mar – tema com o qual demonstra grande conhecimento e sensibilidade – numa alegoria sobre o processo de encanto e desencanto com o mundo, de onde constrói com força e originalidade um autêntico romance de formação - ou bildungsroman.
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A difícil e conturbada transição para a vida adulta faz da adolescência um período de grandes descobertas e incertezas, onde, de alguma maneira, somos forçados a abandonar a magia da infância e a forjar a nossa personalidade em meio a toda sorte de influências externas e acontecimentos que irão marcar nossas vidas para sempre.
Fôlego e equilíbrio, habilidades fundamentais para um bom surfista, são também as forças que moldam o caráter do jovem Pikelet em seu processo de amadurecimento, no envolvimento com personagens fascinantes como o egocêntrico e misterioso guru das ondas Sando, sua depressiva esposa Eva e o inconseqüente e competitivo amigo Loonie.
As experiências vividas no sentimento supremo de desafiar o medo em busca da adrenalina de surfar as maiores ondas e o vazio existencial advindo da incapacidade de se obter este prazer com a frequencia e intensidade desejadas, são responsáveis por moldar a personalidade do homem de 50 anos que resgata suas memórias para os leitores – numa narrativa emocionante e, por vezes, triste e melancólica.
Pessoalmente, se pudesse escolher, não gostaria de voltar aos meus treze anos de idade e acredito que a maioria das pessoas tampouco teria interesse em se submeter novamente às agruras desta difícil etapa da vida onde queremos crescer a todo custo, pois não nos sentimos mais crianças, mas somos ainda muito verdes e impressionáveis, expostos a toda sorte de influências negativas e acontecimentos traumáticos.
Neste contexto, Fôlego se insere numa notável galeria de obras literárias que abordam com propriedade a transição para a vida adulta. O Apanhador no Campo de Centeio de J.D Salinger talvez seja o romance de formação por excelência, uma obra-prima que define o gênero em sua versão moderna com grande maestria, na divertida e cultuada história do jovem Holden Caufield, que foge da escola e se aventura pelas ruas de Nova York.
Para quem curte este gênero, recomendo toda a obra do norte-amerciano John Fante, na minha opinião, um dos melhores escritores de todos os tempos. As aventuras e desventuras do personagem Arturo Bandini - alter ego do próprio autor - em obras como Espere a Primavera Bandini, Sonhos de Bunker Hill, o famoso Pergunte ao Pó e 1933 foi um ano Ruim (este último sem Bandini) expressam como poucos a dor de se sentir um outsider, alguém inadequado e diferente do resto da humanidade - um sentimento comum a adolescentes nos quatro cantos do planeta.
O aclamado Charles Bukowski, conhecido por seus retratos cáusticos de personagens marginais, alcoólatras e desajustados, também enveredou com maestria por este universo no clássico Misto-Quente. Grande admirador do subestimado Fante, ele definiu o colega com precisão em um prefácio: “Finalmente aqui está um homem que não tem medo da emoção”. E o que percebemos como traço comum entre todas estas obras é uma inevitável carga autobiográfica, numa forma artística de reavaliar e superar os acontecimentos marcantes do passado.
Dito isto, se quisermos amplar um pouco o escopo, podemos também verificar que o romance de formação não é uma exclusividade do universo masculino. As memórias de infância da escritora Jeannete Walls no instigante best-seller O Castelo de Vidro apresentam, a sua maneira, uma abordagem feminina para esta temática, onde os primeiros anos de nossas vidas determinam de maneira indelével o que seremos na fase adulta.
Selton Mello em Lavoura Arcaica
Tentei resgatar na memória algum romance de formação de algum autor brasileiro, mas pouca coisa me veio a mente. A própria definição do gênero dá margem a diversas interpretações e, para não deixar de citar alguns representantes nacionais, acho que podemos considerar a poética obra-prima do cinema nacional Lavoura Arcaica, baseada no livro de Raduan Nassar, como um romance de formação genuinamente brasileiro - a obra O Encontro Marcado de Fernando Sabino (que ainda não li) é também citada por estudiosos do assunto.
Quanto ao surf como propulsor de uma corrente literária própria, podemos dizer que trata-se ainda de um gênero em formação.
Foto de abertura: Tim Winton no oeste australiano - créditos: Quentin Jones
Pessoalmente, se pudesse escolher, não gostaria de voltar aos meus treze anos de idade e acredito que a maioria das pessoas tampouco teria interesse em se submeter novamente às agruras desta difícil etapa da vida onde queremos crescer a todo custo, pois não nos sentimos mais crianças, mas somos ainda muito verdes e impressionáveis, expostos a toda sorte de influências negativas e acontecimentos traumáticos.
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Neste contexto, Fôlego se insere numa notável galeria de obras literárias que abordam com propriedade a transição para a vida adulta. O Apanhador no Campo de Centeio de J.D Salinger talvez seja o romance de formação por excelência, uma obra-prima que define o gênero em sua versão moderna com grande maestria, na divertida e cultuada história do jovem Holden Caufield, que foge da escola e se aventura pelas ruas de Nova York.
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Para quem curte este gênero, recomendo toda a obra do norte-amerciano John Fante, na minha opinião, um dos melhores escritores de todos os tempos. As aventuras e desventuras do personagem Arturo Bandini - alter ego do próprio autor - em obras como Espere a Primavera Bandini, Sonhos de Bunker Hill, o famoso Pergunte ao Pó e 1933 foi um ano Ruim (este último sem Bandini) expressam como poucos a dor de se sentir um outsider, alguém inadequado e diferente do resto da humanidade - um sentimento comum a adolescentes nos quatro cantos do planeta.
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O aclamado Charles Bukowski, conhecido por seus retratos cáusticos de personagens marginais, alcoólatras e desajustados, também enveredou com maestria por este universo no clássico Misto-Quente. Grande admirador do subestimado Fante, ele definiu o colega com precisão em um prefácio: “Finalmente aqui está um homem que não tem medo da emoção”. E o que percebemos como traço comum entre todas estas obras é uma inevitável carga autobiográfica, numa forma artística de reavaliar e superar os acontecimentos marcantes do passado.
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Dito isto, se quisermos amplar um pouco o escopo, podemos também verificar que o romance de formação não é uma exclusividade do universo masculino. As memórias de infância da escritora Jeannete Walls no instigante best-seller O Castelo de Vidro apresentam, a sua maneira, uma abordagem feminina para esta temática, onde os primeiros anos de nossas vidas determinam de maneira indelével o que seremos na fase adulta.
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Selton Mello em Lavoura Arcaica
Tentei resgatar na memória algum romance de formação de algum autor brasileiro, mas pouca coisa me veio a mente. A própria definição do gênero dá margem a diversas interpretações e, para não deixar de citar alguns representantes nacionais, acho que podemos considerar a poética obra-prima do cinema nacional Lavoura Arcaica, baseada no livro de Raduan Nassar, como um romance de formação genuinamente brasileiro - a obra O Encontro Marcado de Fernando Sabino (que ainda não li) é também citada por estudiosos do assunto.
Quanto ao surf como propulsor de uma corrente literária própria, podemos dizer que trata-se ainda de um gênero em formação.
Foto de abertura: Tim Winton no oeste australiano - créditos: Quentin Jones
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